Omar, o chefe guerreiro mouro, acabava de reconquistar Trancoso numa fúria destruidora que não poupava crianças, mulheres e velhos. Iberusa Leoa, uma cristã de bonitas feições, conseguiu refugiar-se numa gruta e tornou-se ermitã. Passados tempos, quando pensava ter escapado das mãos dos sarracenos foi capturada pelos mouros e levada para o castelo onde ficou refém para ser trocada por um sobrinho do alcaide, feito prisioneiro pelos cristãos. Guardada dia e noite por quatro mouros que se revezavam, Iberusa começou a falar-lhes do seu Deus cristão e da sua fé. Os mouros renitentes a princípio, acabaram convertidos e resolveram fugir com Iberusa. A cristã e os quatro mouros convertidos encontraram o exército de D. Afonso Henriques que vinha libertar Trancoso e foram imediatamente baptizados. Trancoso foi resgatada pelos portugueses e nas suas imediações ficaram a viver os quatro mouros, numa vida solitária e mística dos eremitas. Ficaram para sempre na memória do povo como os mouros convertidos de Trancoso.
Em tempos que já lá vão, houve um rei espanhol que desesperado por não ter filhos invocou a benção de uma Nossa Senhora dos Milagres, do sítio de Aldeia Rica, em Celorico da Beira, famosa por ter salvado um pastor e a sua vaca de morrerem afogados. O filho nascido deste milagre tornou-se inválido e em vão foram consultados sábios e físicos. A rainha resolveu pedir à Virgem um segundo milagre e juntamente com o rei e o príncipe partiram em romagem à Virgem. Já perto de Aldeia Rica, o pequeno príncipe morreu e o rei desesperado culpou a rainha da iniciativa da viagem e decidiu enterrar o filho ali mesmo. A rainha não o consentiu e, apoiada na sua fé, quis levar o corpo do principezinho até junto da Virgem dos Milagres, depondo-o aos pés da imagem e ali ficando a rezar. O rei descrente resolveu ir caçar e quando lhe disseram que um dos caçadores tinha soltado um dos seus açores reais por achar que as aves tinham sido criadas por Deus para voarem e não para estarem presas, condenou-o à morte, ordenando que começassem por lhe cortar a mão que tinha soltado o açor. Quando o carrasco já tinha levantado o machado, o açor veio pousar na mão que ia ser cortada. O caçador gritou "Milagre!" e ao mesmo tempo chegou a rainha com o seu filho vivo, gritando ela também pelo milagre de Nossa Senhora. O rei libertou o caçador e todos os açores do reino e resolveu construir a igreja de Santa Maria dos Açores, que ainda hoje encerra três lindos painéis que representam "O Aparecimento da Virgem ao Rústico da Vaca", "O Açor Pousado na Mão do Caçador" e "O Filho do Rei, Já Ressuscitado".
Esta é a história de um pastor pobre que vivia numa aldeia triste e tinha por única companhia um cão. Este pastor fitava o horizonte e o seu coração enchia-se de esperança de um dia viajar para além das montanhas que envolviam a sua aldeia. Uma noite de luar em que o pastor olhava o céu estrelado, desceu até ele uma estrela pequenina com um rosto de criança que lhe falou do seu desejo. Estava ali por vontade de Deus, para guiar o pastor para onde este desejasse ir. A partir de então, a estrela nunca mais abandonou o pastor, sorrindo-lhe do céu noite após noite. Até que veio o dia em que o pastor tomou a decisão de partir e chamou a estrela. Os velhos da aldeia abanaram as suas sábias cabeças a tamanha loucura. O pastor partiu e caminhou durante intermináveis anos. O seu cão não aguentou a dura jornada e ficou pelo caminho, marcado por um sinal de pedra. O pastor chorou e continuou em busca do seu destino, envelhecendo junto com a estrela até que um dia chegaram ao seu destino, à serra mais alta, a que ficava mais perto do céu e ali ficaram juntos. O rei da região mandou-lhe emissários com promessas de poder e fortuna em troca da estrela. O pastor respondeu-lhe que a estrela não era dele mas do céu e que nunca a abandonaria. A lenda diz que ainda hoje da serra da Estrela é possível ver uma estrela que brilha mais do que as outras, de saudade e de amor por um pastor.
Almofala foi em tempos terra de Mouros como o indica o significado do seu nome em árabe: "hoste ou arraial de Mouros". Nesses tempos longínquos vivia em Almofala uma jovem muito bela chamada Salúquia que a todos fascinava e trazia presos aos seus caprichos, em completa submissão. Até que um dia um novo governador árabe jovem, bonito e altivo veio chefiar aquela região e a todos pediu obediência completa na organização da defesa na luta contra os cristãos. Todos baixaram as cabeças, excepto Salúquia que, habituada a não obedecer e a ser obedecida, lhe perguntou se ela também teria de obedecer. O governador inteirando-se do estranho poder de Salúquia, disse-lhe que se não obedecesse seria castigada. Desafiadora, Salúquia disse que se ele ousasse castigá-la seria amaldiçoado e, perante o ousado desafio, o governador mandou que lhe dessem seis vergastadas. Passou algum tempo, durante o qual as invasões cristãs não davam descanso ao governador que, de repente, começou a padecer de dores estranhas que nem os melhores físicos conseguiam curar. Era a maldição de Salúquia que começava a fazer efeito.
Os cristãos estavam agora já nos arredores de Almofala
confrontando-se com os mouros. Salúquia que o castigo tinha amargurado andava
pelos campos, vagueando sozinha. Foi então que encontrou um cristão velho e
ferido que lhe pediu ajuda. Salúquia recusou porque iria contra as ordens do
governador. Quando o cristão lhe perguntou se o governador era cruel, Salúquia
surpreendeu-se a si própria ao dizer que era apenas justo. Nesse momento,
surpreenderam-na o tom da sua voz e a emoção que sentiu. Foi então que o cristão
lhe disse o que o seu Deus lhe tinha dito: apesar de ter amaldiçoado o
governador Salúquia amava-o e, pelo seu lado, o governador também a amava e
nunca a tinha esquecido. Se Salúquia o ajudasse, o Deus dos cristãos também a
ajudaria a reparar o mal que tinha feito com a sua maldição. A pedido do ferido,
Salúquia levou-o a uma fonte próxima e verificou com espanto que as suas águas
lhe saravam as feridas. Nesse momento, Salúquia e o cristão ouviram os passos de
um cavalo que se aproximava: era o governador que quando os viu se apeou do
cavalo. As dores fortes que sentia interromperam as suas primeiras
recriminações. Salúquia deu-lhe a beber a água da fonte e começou a chorar,
dizendo-lhe que era capaz de dar a vida por ele. O governador, curado das suas
dores, abraçou-a e disse-lhe que a amava desde o primeiro momento que a tinha
visto, mas o orgulho de ambos os tinha afastado. O cristão desapareceu e
Salúquia e o governador viveram felizes para sempre. Mais tarde, quando aquelas
terras foram conquistadas pelos cristãos, foram ambos baptizados. As águas de
Almofala continuam ainda hoje, diz o povo, a manter os seus incríveis poderes
curativos.
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